A usucapião é muito utilizada quando uma pessoa mora no imóvel e age como se fosse dona dele, sem ter, contudo, a formalização da propriedade em seu nome no cartório de registro de imóveis.
Existem várias modalidades de usucapião, cada uma com requisitos e características próprias.
Uma dúvida frequente quando se fala em usucapião é a seguinte: Pode um herdeiro usucapir um imóvel que não foi levado ao inventário?
Vamos de um exemplo:
Jorge e Maria faleceram e deixaram 1 imóvel para seus três filhos (Gilson, Luiza e Rodolfo), que não fizeram o inventário dos pais.
Luiza mora sozinha no imóvel há 20 anos, tendo realizado obras e arcado com todas as despesas, como IPTU, faturas de água, condomínio, dentre outras.
Seus irmãos nunca questionaram o fato de Luiza morar no imóvel, nem nunca cobraram aluguel pelo seu uso exclusivo.
Luiza pode usucapir o imóvel?
Sim. De acordo com o art. 1.238 do Código Civil, Luiza pode usucapir o imóvel desde que:
- Tenha mais de 15 anos de posse;
- Sua posse seja pacífica (sem oposição) e ininterrupta;
- Tenha agido como se dona fosse por todo esse tempo.
No caso do exemplo, Luiza teria que comprovar que morou no imóvel por mais de 15 anos, que ninguém nunca se opôs a isso, e que ela quem cuidou do imóvel durante todo esse tempo.
A consequência da usucapião é que Luiza pode adquirir a propriedade do imóvel só para ela, formalizando isso no cartório de registro de imóveis.
Assim, seus irmãos perdem o direito à propriedade, sendo que o imóvel deixa de poder ser incluído no inventário dos pais falecidos.
E se o inventário for aberto antes de Luiza pedir a usucapião?
Nesse caso, Luiza pode se defender argumentando que já preencheu todos os requisitos da usucapião e que, por isso, esse bem precisa ser retirado do inventário e da partilha.
Agora, se Luiza não fizer isso no momento correto, o imóvel vai ser inventariado e ela perde o direito à propriedade integral, tendo que dividi-la com seus irmãos, mesmo depois de ela ter cuidado por todos os anos sozinha e arcado com todas as despesas.
Os herdeiros de Luiza podem pedir a usucapião?
Caso Luiza não tenha pedido o reconhecimento da usucapião em vida e o imóvel nunca tenha sido levado para inventário e partilha, os filhos de Luiza podem pedir a usucapião usando seu tempo de posse.
Essa soma do tempo de posse está prevista no art. 1.243 do Código Civil.
Vamos exemplificar: se Luiza ficou por 20 anos no imóvel e depois falece, seus filhos podem pedir a usucapião usando esses 20 anos de posse da sua mãe, desde que os demais requisitos estejam preenchidos.
Luiza pode pedir a usucapião, junto com seus irmãos, ao invés de abrir inventário?
Nesse caso, segundo entendimento de decisões judiciais, não será possível. Isso porque a usucapião não pode ser usada para substituir o inventário.
Em outras palavras: Luiza poderia, sozinha, pedir o reconhecimento da usucapião contra os irmãos, para que fique sozinha com o imóvel, visto que agiu como se dele fosse dona durante muitos anos, suportando sozinha todos as despesas.
Mas, se todos os irmãos pedirem a usucapião, o pedido pode não ser reconhecido, já que o Poder Judiciário pode entender que se está tentando burlar o inventário dos pais, já que o caminho correto é a abertura de inventário para que todos os herdeiros tenham o bem.
Os herdeiros, para que tenham o bem no nome deles, precisam pagar o imposto de transmissão causa mortis (ITCMD), em alguns Estados conhecido como ITD.
Se permitissem a usucapião para todos os herdeiros ao mesmo tempo, isso poderia representar uma forma de escapar do inventário e do pagamento do imposto.
Qual o problema de não pedir a usucapião?
Quando a pessoa já preencheu todos os requisitos da usucapião e deixa de buscar o reconhecimento desse direito, existem os seguintes problemas e riscos:
- A pessoa não tem o imóvel no seu nome, então não consegue vende-lo;
- Desvalorização do imóvel, ante a situação registral;
- Risco de algum herdeiro abrir o inventário e conseguir a partilha do imóvel, fazendo com que aquele que cuidou do imóvel por anos agora tenha que dividi-lo com outras pessoas.
Por isso, é importante consultar um profissional de sua confiança para orientação quanto às possibilidades e formas de se pedir o reconhecimento da usucapião.